Por Vitor Plácido dos Santos Peres 1 


Desde 2015, ano marcado pelo recrudescimento da crise venezuelana, mais de 3 milhões de pessoas deixaram o país caribenho em direção, principalmente, a países como Colômbia, Peru, Equador, Chile e Brasil. Roraima tem sido o principal corredor de entrada de migrantes venezuelanos em território brasileiro, adicionando mais complexidade a uma fronteira historicamente problemática. A fronteira entre os dois países, tendo em vista o intenso fluxo humano que ali ocorre e também a deficiência do Estado brasileiro em manter políticas efetivas nos espaços fronteiriços, se tornou espaço privilegiado para os ilícitos transnacionais. Abordaremos quatro expressões das novas dinâmicas na fronteira norte do Brasil envolvendo organizações criminosas venezuelanas.

 

  • Em 2016, Humberto Prado, diretor da ONG Observatorio Venezolano de Prisiones, que tem como missão acompanhar o estado geral da observância dos direitos humanos dentro das prisões venezuelanas, já alertava sobre a situação extremamente precária dos presídios do país caribenho. Boa parte das unidades prisionais venezuelanas serviu de nascedouro das principais facções criminosas da Venezuela.

 

  • Com a intensificação do fluxo migratório entre Venezuela e Brasil, a presença de detentos venezuelanos em penitenciárias brasileiras cresceu significativamente nos últimos anos. O PCC (Primeiro Comando da Capital), uma das principais facções criminosas brasileiras, tem aumentado suas fileiras e sua capacidade de internacionalização, em decorrência da injeção de detentos de origem venezuelana nas unidades prisionais do estado de Roraima, principalmente na Penitenciária Agrícola do Monte Cristo. 

 

  • Recentemente, autoridades da Secretaria de Estado de Segurança Pública de Roraima (SESP - RR), do Departamento Penitenciário Nacional (Depen) e da Polícia Federal confirmaram a existência de um núcleo da facção criminosa venezuelana conhecida como Pranato, surgida nos interiores das penitenciárias do país caribenho, no Brasil. 

 

  • A convergência das crises penitênciarias venezuelana e brasileira com a intensificação dos fluxos humanos entre os dois países levou ao acirramento das disputas entre facções criminosas na região fronteiriça entre Brasil e Venezuela. Os ilícitos praticados vão do tráfico de drogas,  da lavagem de ativos à ação de coiotes, que transladam pessoas do país caribenho até o Brasil. 

 

Uma intensificação das ações de um número cada vez mais significativo de organizações criminosas em uma região historicamente volátil atua como catalisador de instabilidade. O deslocamento intenso de pessoas em decorrência da trágica crise política, social e econômica que aflige o povo venezuelano não mostra de arrefecimento. Isso cria uma ambiência cheia de oportunidades para que essas mesmas organizações se fortaleçam ainda mais, tornando mais complexo o panorama de (in)segurança nas fronteiras brasileiro-venezuelanas, particularmente nos espaços fronteiriços adjacentes ao corredor rodoviário que une Boa Vista a Caracas. A exemplo do que ocorre em diversos espaços fronteiriços  entre Venezuela e Colômbia, onde o fluxo migratório e a presença de grupos do crime organizado são de muito maior magnitude que nas fronteiras com o Brasil, o fortalecimento destes grupos não representa apenas um complicador, mas assume expressões e importância próprias e, embora mantenham relação simbiótica e contextual com a crise migratória, dão ensejo a situações que tendem a perdurar mais além desta, inscrevendo-se como fator de maior permanência a contribuir para um quadro de instabilidade e insegurança em tais espaços.

 

Graduando em Relações Internacionais na Universidade Federal de Roraima (UFRR), pesquisador da linha Entorno Estratégico Brasileiro, do Grupo de Estudos e Pesquisas em Segurança Internacional (GEPSI).